sexta-feira, janeiro 23, 2009

Pessimismo e monstruosidades mentais


Cena I

Acordo tarde, quase meio dia, acho, sol da porra, da puta que pariu, quentura do inferno, calor de agosto, pesado e sinistro como só agosto, gosto de sangue na boca dormida, me deram um soco, num sonho, nem sei quem foi o filho da puta que me arrebentou os dentes, nem dá pra sonhar de novo e quebrar-lhe o nariz, caralho, é que mordi a língua enquanto gritava palavras sem nexo pra uma multidão suja e feia, noutro sonho encardido e, que bosta, cagaram e não deram descarga, e a merda fica boiando, me olhando com cara de bosta, me interrogando, o que custa apertar um botão pra merda ir pra puta que a pariu, pras profundas do esgoto, que é o lugar dela, mas não, não fizeram o favor, e tenho de olhar pra isso logo no começo, deve dar azar, começar o dia olhando pro cocô alheio, eu creio, o espelho, ah, o espelho sincero e exato, desgraçado, minha cara amarrotada e esses olhos tristes com detalhes “Mortiça Adams” ao redor dos cílios, cabelo indescritível e, ah. Porra, essa água azeda no estômago, porra, porra, porra.

Cena II

Os sons, o silêncio, os sons do silêncio, tudo me incomoda, hoje, estar viva me incomoda, atravesso a rua, carros, motocicletas do capeta, e essas coisas monstruosas chamadas ônibus, essa piranha gorda bem que podia andar mais rápido, fica empacando minha vida, agora está estacionada na calçada, olhando para três frangos assados nojentos e gordos que nem ela, da boca da putona escorre saliva, cadela, porca, dá licença dona, digo, mas queria era socar até matar aquela cara obesa de prostituta do lar e enfiar no rabo dela um frango assado inteiro, dá licença, dona, repito, ela sai da frente e me olha com cara de cu e passo, marcho para o inferno, resignada, o supermercado, cheio, é quase o fim, o fim de semana e o fim da linha, ah, briga na fila do caixa, sei lá por que, tomara que se matem, os infelizes, um filho da puta chuta minha cerveja,ah, tudo tão pesado, as compras , o dia, coloquei as latas no chão pra descansar os braços e um cuzão cego chuta minha cerveja, as latinhas deslizam, deslizam, como uma patinadora desengonçada e param perto dos sacos de arroz. Não falo nada, filho da puta, corno, vai tomar no cu, quase grito.

Cena III

Menor, insignificante, e essa porra de água azeda no estômago, ah, quero vomitar a vida , em golfadas fortes e obscenas, vomitar meu medo da morte, minha covardia, meus fracassos, minhas raras e rasas alegrias, meus amores intensos e doídos, quero vomitar a podridão que me espera, todos os desprazeres, os esforços em vão, os meus sonhos mais belos e ingênuos, essa luz toda, toda essa luz(dor de cabeça!), esse barulho insuportável de silêncio, a vida, essa coisa gordurosa.
Que náusea, tomar no cu, que náusea,
Poesia? Sempre vai ter a merda boiando na privada. Eu desisto.

quarta-feira, janeiro 21, 2009

Hormônios colidindo com estrelas


Ao passar uma temporada de extase no inferno, Rimbaud, o alquimista das palavras delirantes, proferiu: " Sei hoje saudar a beleza".O saber exige aprendizado, processo, ainda mais quando se trata de algo que diz respeito à sensibilização do olhar, à abertura dos poros,à educação dos ouvidos.Vemos o "Belo".O tocamos às vezes. O ouvimos.Uma sinfonia, uma tela expressonista, uma pétala orvalhada na moldura triste de uma manha fria de inverno...Imagens e sons. Tato. Olfato. Audição.
Saudar: tirar o chapéu, reverenciar, acenar com as mãos.Não quero mais o desespero dessa limitação.
Com ela, me acostumei a colocar a beleza em minha boca, mordê-la de leve, como quem espreme entre os lábios uma borboleta, numa atmosfera absurda. Prefiro que a beleza possua meu corpo,a começar pelo nariz, violentado por perfumes singulares, tais como adocicados cheiros de fios de cabelos cor- de ouro e de seios ardendo de desejo.Os seus perfumes singulares. Que provocam a fúria de minha delicada voracidade.Uma vez, numa mesa de bar, rabisquei para ela, num pedaço amassado de papel, umas palavras que diziam que eu tinha me tornado uma incompetente poeta, uma vez que ela tinha substituido a poesia em minha vida, por ser a minha fuga de todos os clichês e meu salto para fora de todas as convençôes.Todo poeta vive assim:Remexendo um caldeirão repleto de poções mágicas em busca de versos que cantem uma melodia diferente. Uma melodia digna de saudaçoes. O poeta quer fazer a palavra cantar. O poeta que tornar a beleza audível, visível, tocável.Mas chega o momento decisivo, de insustetável sofrimento: é quando o poeta deseja comer a beleza. Se cansa do velho caldeirão e começa a mastigar pétalas, beber as águas das chuvas, devora, literalmente, paginas inteiras de poesia. E o sofrimento reside justamente no fato de nem as flores, nem as águas, nem os livros de poemas poderem retribuir seu amor. O poeta deseja e ama sozinho. Eis a sua tragédia. Muitas vezes é tão imensurável seu desespero que a vida já não basta. E ele decide morrer.
Passei minha vida remexendo o tal caldeirão.Mas, como rabisquei naquele papel pardo, há alguns anos, isso não faz mais sentido.
Ela enche meus olhos de luzes mágicas, de cores impossíveis, de delicadezas de gestos, de sinuosidades deliciosas entre lencóis, de movimentos sutis de lábios molhados entreabertos, da lascívia magnífica de dedos deslizando em meio às pernas, seios, boca que me nutre.Ela transborda meus ouvidos de sons de hormônios colidindo com estrelas e astros e nuvens de tempestades e harmonias inquietantes em espaços oníricos onde escorre lava.Ela enche minhas mãos de curvas, onde me perco por instantes, para , em seguida, nos encontrarmos, exaustas de amor .Ela é a minha mais incrível "experiência" poética.
Aprendi a devorar a beleza.

terça-feira, janeiro 20, 2009

Era uma vez um pássaro delicado
cujo voo surpreendente
resultou
em queda triunfal
nas armadilhas dos meu lençóis.