domingo, setembro 18, 2011

Contos de vacas I

Era uma vez um lobo que queria ser mau. No fundo ele era até bonzinho, no entanto seu pai havia sido mau, seu avô também e seu tataravô já tinha até devorado uma velhinha inteira, sem mastigar!
Então o lobo queria ser mau, mais por obrigação do que por maldade inerente.

Mas o lobo não conseguia ser mau, porque ele era um lobo torto.
Tinha as orelhas tortas.
Tinha os olhos tortos.
Tinha o nariz torto.
Tinha a boca torta, os dentes tortos,o pescoço e as pernas.Tudo torto.
Todo mundo ria do lobo torto.

Um dia ele decidiu atravessar a floresta em busca da casa de uma velhinha que gostava de doces e tinha uma netinha que só usava roupas vermelhas. Ele pensou:

"Nem poderei assustar a menininha dizendo que minhas orellhas tortas servem para ouvi-la melhor; e que meus olhos tortos servem para vê-la melhor e que meu nariz torto serve para cheirá-la melhor e que meus dentes tortos servem para comê-la melhor. Meus ancestrais sempre se orgulharam tanto desse discurso! Mas ai de mim! Sou todo torto! Mas quem sabe eu não mate a menina de tanto  rir, assim, poderei devorá-la."
E povoado por pensamentos melancólicos, o lobo torto seguiu seu caminho.

Finalmente chegou à casa da vovó.
Ao olhar pela janela, viu que a velhinha e a menina vermelha tomavam chá e conversavam descontraidamente. Bateu na porta:

__ Quem é? __ Disse a menina.
__ O lobo mau! Aquele que pega as criancinhas pra fazer mingau!__Ele respondeu, tentando engrossar a voz.
__ Vovó! Acho que tem outro idiota lá fora tentanto passar trote! Que saco!__ Dizendo isso, abriu a porta.


Ao se deparar com aquele bichão todo disforme a menina não riu.Ficou tão comovida que começou a chorar.
O lobo, envergonhado, abaixou a cabeça, e chorou também.

Então, o tempo parou um pouquinho.Depois, o pouquinho virou eterno, com  direito a ter um fim, caso o tédio de deus fosse maior que sua vontade de descansar.

Uma fada, meio desorientada,passou por ali  e, sem querer, encostou a varinha de condão nos grossos pêlos do lobo torto.

Algumas eternidades depois, alguém descongelou o tempo.

As lágrimas do lobo, que tinham ficado brilhando na ponta do nariz, despencaram e penetraram a umidade da terra.
O lobo torto foi encolhendo, encolhendo, encolhendo, até se transformar num adorável cachorrinho de estimação.

2 comentários:

Samuel Medina (Nerito Samedi) disse...

Puxa, não sabia se ria ou ficava triste. Legal o pensamento torto do lobo... pensamentos melancólicos sobre matar alguém de rir. Gostei muito desse conto-de-fadas torto!

Simone Teodoro disse...

Pois é uma tragicomédia fadística. hehhehe